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17 de janeiro de 2023
Ao invés de corrigir falhas de mercado, entes reguladores podem gerar outros tipos de ineficiências
É comum haver regulação para o exercício de determinadas profissões. Essa regulação pode ser proveniente do Estado ou pode acontecer por meio dos conselhos profissionais mediante delegação estatal. Normalmente os dispositivos abordam questões relacionadas ao ingresso na profissão, à conduta dos profissionais, à exclusividade para o exercício das atividades ou à organização das firmas daquela profissão.
O argumento econômico para a existência dessas regulações consiste na existência de falha de mercado referente à assimetria de informação em alguns mercados profissionais. Essa assimetria pode gerar problemas como a incapacidade de o consumidor aferir a qualidade dos serviços que serão prestados a ele.
Ocorre que a regulamentação dos serviços profissionais pode proteger os consumidores vulneráveis, mas também pode impedir a inovação e outras formas de concorrência. Em muitos países, essas preocupações já vieram à tona como o efeito de a regulamentação profissional restringir a concorrência no mercado de serviços profissionais, aumentando o preço e limitando a variedade e inovação nos serviços prestados. Além disso, alguns estudos demonstram que as restrições à entrada podem ter o efeito de diminuir a qualidade geral do serviço.
Nessa linha, um tipo de regulação que tem se mostrado ineficiente consiste nas restrições à publicidade. A limitação da divulgação de serviços por associações profissionais é uma preocupação específica dos membros da OCDE, conforme sua publicação “Policy Roundtables – competition in professional services”[1]. Segundo esse estudo, a regulamentação das profissões deve centrar-se somente nos mercados em que persistem efeitos indesejáveis por conta da assimetria informacional, sendo que a intervenção deve ser feita com parcimônia para prejudicar o menos possível a concorrência.
Segundo o estudo citado da OCDE, a publicidade por algumas classes de profissionais geralmente esteve sujeita a uma regulamentação rigorosa, tanto de forma quanto de conteúdo. Informações básicas sobre nome, endereço e número de telefone e alguns detalhes sobre especialização geralmente podem ser divulgados, mas, tradicionalmente, anúncios sobre preços e comparações com outros profissionais eram proibidos. As restrições à publicidade parecem ter sido particularmente difundidas nas profissões jurídicas e médicas. Apesar dessa prática de restrição de publicidade ainda existir, tais proibições estão sendo cada vez mais contestadas, uma vez que impedem a inovação e aumentam os preços.
A publicidade na maioria dos setores da economia desempenha um papel importante na informação dos consumidores e na garantia de que novos produtos, serviços e fornecedores sejam levados ao conhecimento do público. A publicidade, portanto, pode incentivar a inovação e a oferta de novos produtos. Por outro lado, sua restrição pode criar dificuldades ao consumidor médio para saber onde encontrar ajuda especializada ou determinar o preço provável de um serviço.
Em suma, a publicidade afeta três questões fundamentais para a concorrência: inovação, entrada e preço. As controvérsias sobre como se dará a publicidade incorporam o debate sobre a necessidade de manter a qualidade e compensar a falta de informação dos consumidores, evitando enganos e outros danos aos usuários dos serviços.
Nos países em que houve a abolição das restrições à publicidade, houve benefícios para os consumidores. Há evidências de que a remoção das restrições de publicidade de preços resultou em preços mais baixos, bem como propiciou o aumento da demanda.
Um estudo canadense[2] concluiu que a publicidade de preços dos serviços profissionais melhoraria o acesso do consumidor a esses serviços, promovendo menores tarifas e gerando aumento da eficiência e inovação.
As regulamentações muitas vezes impediram os profissionais de saúde de fazer publicidade verdadeira e não enganosa sobre preços, descontos e serviços. A remoção dessas restrições é extremamente importante para promover a concorrência, pois a concorrência por preços e novos serviços será muito menos eficaz, ou pode até não se desenvolver, se os profissionais não puderem dizer ao público que estão fazendo isso.
Em 1975, a Comissão Federal de Comércio dos EUA (US FTC) desafiou as regras da Associação Médica Americana (AMA) que suprimiam virtualmente todas as formas inovadoras de publicidade de médicos e organizações de prestação de serviços de saúde. A decisão, emitida em 1979, impediu a AMA de proibir publicidade verdadeira e não enganosa. Essa passou a ser a regra, permitir a competição, com cuidado com o que se leva ao consumidor. O objetivo foi garantir maior concorrência e custos mais baixos [3].
Aqui no Brasil, restrições à publicidade profissional também foram alvo recentemente de crítica no âmbito do Programa Frente Intensiva de Análise Regulatória e Concorrencial (FIARC), do então Ministério da Economia, ao analisar norma editada pelo Conselho Federal de Contabilidade (CFC). A norma foi classificada com bandeira vermelha pelo FIARC, uma vez que acarreta “restrições à publicidade no âmbito de serviços contábeis pelo emprego de requisitos de conceituação ambígua, prejudicando a concorrência e gerando desincentivos à eficiência econômica”[4].
Sob a perspectiva da Análise Econômica do Direito, a regulamentação de atividades profissionais é bem-vinda para garantir um ambiente de qualidade técnica profissional, corrigindo falhas de mercado. Contudo, deve-se estar atento aos excessos de modo que tal regulamentação não pode ocorrer de forma a atrofiar sobremaneira a livre iniciativa e a livre concorrência.
O desenho dos marcos regulatórios e das políticas públicas tem impacto forte na matriz institucional de um país – esta entendida como o conjunto de normas, decisões administrativas e judiciais, assim como os costumes e as tradições da sociedade civil, que moldam a maneira como as pessoas vivem em comunidade. A matriz institucional pode favorecer ou dificultar o desenvolvimento econômico.
O Guia de Análise de Impacto Regulatório do Governo Federal considera a interação entre a regulação e concorrência e dispõe que “a regulação deve, simultaneamente, ser combativa às práticas anticoncorrenciais sem perder o foco na busca de normas que incentivem um ambiente pró-concorrência. Pode parecer algo elementar, mas nem sempre a busca de combate às infrações à ordem econômica representa a construção de um cenário competitivo” [5].
Em conclusão, devem ser combatidas regulações que incorram em abusos regulatórios, conforme previsto no artigo 4º da Lei 13.874, de 2019, que instituiu a “Declaração de Direitos da Liberdade Econômica”. Esse dispositivo segue o raciocínio de que as decisões concretizadas pelas ações dos agentes reguladores, ao invés de refletirem o interesse da sociedade, podem, na verdade, ocasionar perdas de bem-estar social. Ou seja, ao invés de corrigir falhas de mercado, os entes reguladores podem gerar outros tipos de ineficiências. Esse tem sido exatamente o caso de várias restrições à publicidade estabelecidas pelos conselhos profissionais no Brasil.
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