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21 de setembro de 2023
Hoje é comemorado o Dia da Pessoa com Deficiência – mas, no campo digital, ainda há pouco a celebrar. De acordo com pesquisa conduzida pela BigDataCorp em parceria com o Movimento Web para Todos, menos de 1% dos sites brasileiros são acessíveis. O levantamento de 2022 avaliou 21 milhões de sites ativos no País – número 25% maior do que na edição anterior – e identificou que 0,46% dos sites tiveram sucesso em todos os testes de acessibilidade aplicados, contra 0,89% da edição anterior.
Em entrevista ao IT Forum, Simone Freire, idealizadora do Movimento Web para Todos, explica que o número ínfimo tem algumas razões. A primeira delas é que as pessoas com deficiência estão saindo do ciclo de “invisibilidade” e estão começando a exigir os direitos como cidadãos, inclusive na web.
Murillo Cita, líder de acessibilidade digital da Yaman, ressalta que, ao falar de acessibilidade, é preciso pensar em um acesso universal. “As pessoas imaginam que apenas um grupo específico de pessoas com deficiência, com qualquer limitação física ou cognitiva, está englobado. Mas, uma mãe com criança de colo e está apenas com uma mão livre e precisa fazer uma operação bancária, precisa de acessibilidade pois não conseguirá fazer algo complexo. Ou seja, a acessibilidade digital ajuda não somente um grupo, mas qualquer pessoa.”
“Até então, faltava esse empoderamento de entender que elas têm o direito de ter acessibilidade nos sites. Também tem o viés da falta de conhecimento dos profissionais que estão trabalhando com o digital. Quem desenvolve toda a parte do código, da experiência de usuário e que está produzindo, ainda não tem o conhecimento de que existem diretrizes internacionais que devem ser seguidas para deixar o digital acessível”, explica Simone.
Por fim, tem a ponta das próprias empresas, que estão começando a se familiarizar com o digital. Elas estão começando a entender que existem leis que obrigam a acessibilidade digital.
“Vai muito da falta de conhecimento e falta de cultura de acessibilidade, não só de quem desenvolve, mas também dos empresários e pessoas de negócios. Muitos não sabem que esse também é um mercado amplo, de US$ 20 bilhões só no Brasil. Segundo o último Censo, 25% da população tem alguma deficiência. É um mercado muito grande, mas, por algum motivo, não é levado em conta”, frisa Murillo Cita, líder de acessibilidade digital da Yaman.
Murillo, que é cego, conta um pouco de sua experiência. “Apesar de ser um usuário mais avançado, eu também tenho minhas dificuldades e sinto as frustrações quando eu pego um aplicativo ou um site para realizar alguma atividade e não consigo. Eu sou obrigado a procurar uma concorrente ou, se for algum serviço indispensável, pedir uma ajuda de outra pessoa, explicar porque eu preciso daquilo, o que ela deve fazer e isso gera um sentimento ode impotência nas diversas situações da vida. Você trabalha, estuda, tem uma vida social ativa e uma questão simples você se vê dependente de outra pessoa.”
O primeiro conselho de Simone é: não será do dia para a noite. Em uma analogia à acessibilidade física, se uma empresa está em um prédio super antigo e precisa colocar coisas como rampa, elevador e piso tático, isso não será feito de uma vez.
“No digital, não é diferente. O início é entender como é o estágio atual da presença digital da organização. Porque é tudo muito no feeling – de repente, o site que foi feito recentemente, mesmo que não por uma agência especializada, mas que está trabalhando com SEO e outras práticas, mesmo sem saber, está trabalhando com acessibilidade”, frisa a idealizadora do Movimento Web para Todos.
Depois, há uma série de passos que dependerão de alguns fatores. Se a empresa tem uma empresa interna, é necessário um processo de capacitação do time. É feito um diagnóstico, avalia as condições, quais são as barreiras, se toda a comunicação está acessível. E, em seguida, há a estruturação do plano de ação.
“Um aspecto crucial para o desenvolvimento de produtos e serviços acessíveis é ter uma política clara de acessibilidade que envolva todas as equipes e fornecedores de tecnologia. Isso vale tanto para o setor público como privado. Quando não existe uma cultura corporativa ou institucional para aplicar a acessibilidade, ela fica de lado ou em segundo plano e isso afeta diretamente o produto”, destaca Gustavo Torniero, jornalista e ativista pelos direitos das pessoas com deficiência.
Segundo o ativista, a criação de um site ou aplicativo deve levar em consideração a facilidade de uso e acesso por diferentes públicos, com e sem deficiência, desde o início. Corrigir problemas é sempre mais custoso do que iniciar o projeto com essa mentalidade.
O executivo da Yaman aponta as Diretrizes de Acessibilidade para Conteúdo Web (WCAG) como a mais seguida em todo o mundo. Ela traz princípios e parâmetros que devem ser seguidos para que o mínimo de acessibilidade possa ser atingido. São 3 categorias A (simples), B (intermediário) e C (que seria a internet quase perfeita).
Além disso, a ABNT lançou suas próprias diretrizes (com base nas diretrizes WCAG) e a própria Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência tem direcionamentos que as empresas devem seguir.
No dia 8 de setembro, menos de um mês antes do Dia da Pessoa com Deficiência, Torniero postou em sua rede social que o Sistema do Governo Federal para emissão de nota como MEI não teria acessibilidade para pessoas cegas.
Em uma thread no X (antigo Twitter), o ativista postou vídeos (que você pode acessar aqui) e detalhou: “No site, o leitor de tela identifica links como imagens, não lê dois botões de submenu e verbaliza informações estranhas e desnecessárias, como o número 35 e a palavra menu. Já no aplicativo o leitor fica em silêncio na maior parte do tempo.”
Conversei com Torniero, que disse ter MEI desde 2018 e usava o site da Prefeitura de São Paulo e que, apesar de também ter problemas, era possível fazer suas Notas Fiscais. Porém, desde setembro desse ano, todos tiveram que migrar para o site do Governo Federal.
“E a acessibilidade desse site é quase nula. Todos os elementos da página, todos os links, todos os formulários têm graves problemas de acessibilidade para a navegação de quem está utilizando o teclado e o leitor de tela. E isso vai de encontro à toda legislação que temos em relação à acessibilidade no País – tanto a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência quanto os princípios básicos da nossa Constituição Federal”, alerta Torniero.
Segundo ele, isso faz com que a pessoa com deficiência não tenha respeitado o seu direito de acessar serviços públicos e possa exercitar a sua cidadania. “Eu pago mensalmente para manter a minha empresa MEI para realizar os meus trabalhos e tenho essa dificuldade em um site governamental. É difícil saber quais foram os padrões usados, por exemplo”, finaliza.
Confira matéria no IT Forum
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