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Criar e compartilhar fake news é crime?

Fonte: G1

21 de março de 2022

Especialistas explicam se no Brasil há uma lei específica que pune quem cria notícias falsas e por que o debate sobre liberdade de expressão e combate à desinformação é complexo nas redes sociais

No Brasil, o Código Penal prevê três configurações de crimes ligados a boatos e mentiras, os chamados crimes de honra. São eles: calúnia, difamação e injúria.

Veja o que cada um significa e as penas previstas:

  • Calúnia: Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime. Pena: detenção de seis meses a dois anos e multa.
  • Difamação: Difamar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação. Pena: detenção de três meses a um ano e multa.
  • Injúria: Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro. Pena: detenção de um a seis meses e multa.

Todos têm penas semelhantes, e a detenção menor que quatro anos pode ser convertida em cesta básica e outros serviços.

Então, isso quer dizer que, de acordo com o Código Penal, um boato sobre alguém, por exemplo, pode ser considerado crime contra a honra, mas depende do conteúdo e da avaliação de um juiz em cada caso, se a pessoa foi processada.

Para ajudar a entender estas e outras questões, o Fato ou Fake lançou no dia 7 de março, no g1 e no YouTube, uma série de vídeos que explicam o que está por trás deste fenômeno. Publicados semanalmente, os episódios mostram também o que fazer para não se tornar uma vítima da desinformação.

O advogado Francisco Brito Cruz, diretor do InternetLab, centro de pesquisa em direito e tecnologia, afirma que, sim, o Código Penal brasileiro pode ser aplicado quando o tema é fake news.

“Criar e compartilhar fake news, desinformação, não é um crime em si no Brasil. Se você postar uma mentira na internet, você não está cometendo um crime naquele momento, mas, dependendo da mentira, do dano que ela causa, do contexto, ele pode ser enquadrado em outros crimes”, explica Francisco.

Além dos crimes contra a honra, as fake news podem se enquadrar em outros tipos penais, dependendo do seu conteúdo e forma de distribuição, afirma a advogada e especialista em direito digital Gisele Truzzi.

“Pode ser um crime de racismo, de preconceito racial, de homofobia. A gente já tem esses crimes definidos na nossa legislaçao”, explica. “Pode ser uma difamação se eu criar uma matéria falsa ou notícia fradulenta com o intuito de diminuir uma pessoa, criar problemas ou constrangimentos para ela, seja na vida pessoal ou profissional.”

Segundo Truzzi, o crime pode ser cometido não apenas pela pessoa que criou a informação falsa, mas também por aquelas que espalharam a mentira.

Nina Santos, pesquisadora do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia e da Université Paris II, complementa que a discussão jurídica sobre desinformação no Brasil é ampla, já que envolve não apenas usuários da internet, mas também empresas.

“Temos uma discussão jurídica bastante ampla sobre como caracterizar a questão das fake news não só na penalização das pessoas, que por um lado é importante, mas, por outro lado, parece ser insuficiente. Temos que entender como podem funcionar as regulações das plataformas em relação a esse tema. Não pensar só no nível individual, mas pensar no institucional e no coletivo”, diz.

Liberdade de expressão x combate à desinformação

Os especialistas destacam que, na discussão jurídica sobre fake news, a liberdade de expressão e o combate à desinformação são assuntos que entram em tensão. Isso porque, segundo Cruz, a cultura de liberdade de expressão ainda está sendo formada no Brasil.

“No Brasil, temos uma cultura de liberdade de expressão que está nascendo. Não há um consenso como resolver [os limites entre liberdade de expressão e combate à desinformação]. Quando chega a desinformação pela internet, que é uma camada de complexidade ainda mais importante, os casos ficam ainda mais difíceis de resolver”.

Gisele Truzzi esclarece que é importante que as pessoas conheçam os limites da liberdade de expressão. “Criar, compartilhar e fazer notícias fraudulentas não é liberdade de expressão. Liberdade de expressão é você exprimir a sua opinião de acordo com o que você pensa, com o que você acredita, desde que isso não afete direitos de terceiros”, diz.

Na opinião do diretor do InternetLab, é preciso criar uma conscientização sobre a responsabilidade de cada um nas redes.

“O que a gente precisa é criar uma cultura do que é liberdade de expressão ou não, uma discussão sobre isso e tentar entender jeitos de resolver esses casos diferentes. Com isso, a gente vai caminhar cada vez mais para um cenário de mais consenso”.

O que fazer para evitar cair em fake news?

Diante da pandemia da desinformação, uma questão que surge é como não cair nas armadilhas das mensagens falsas que circulam nas redes sociais.

Os especialistas dão uma série de dicas simples. Veja abaixo as principais:

  • Procurar informações e opiniões contrárias às nossas: “Você vai votar no candidato 1? Legal. Entra no candidato 2 e vê o que ele está falando também. Tenha contato com informações que são aparentemente incompatíveis, pois isso vai lhe dar uma opinião mais sensata e equilibrada”, diz o psicólogo Cristiano Nabuco, do Instituto de Psiquiatria da USP.
  • Reler as informações: “Sempre que eu leio alguma coisa que eu sinto que fiquei muito irritado, que me deixou indignado, eu falo: ‘Opa, estão atuando em cima de mim. Vamos devagar. Vamos ler isso de novo. Será que isso é verdade? Isso que está escrito é factível? Será que, de fato, esse candidato ou essa pessoa falaria isso?'”
  • Checar as informações em várias fontes: “Cruzar informações, buscar a origem e ter certeza”, diz Nabuco. “Faça uma leitura lateral. Abra uma aba do lado e pesquise. Será que algum jornal falou isso?”, diz Yurij Castelfranchi, professor da UFMG.
  • Jogar um trecho da mensagem em um buscador: “Veja se aquele trecho já aparece em outras fontes. Eu sei que a maioria das pessoas que acredita em fake news não confia nos jornalistas, mas a mídia é diversa. Se ninguém fala não é porque todo mundo esconde, é porque é mentira”, diz Castelfranchi.
  • Não compartilhar caso tenha dúvida: “Na dúvida, não passar adiante, pois você também faz parte desse processo”, diz Nabuco.
  • Manter-se informado: Nabuco afirma que estar por dentro dos acontecimentos também ajuda a desconfiar e a não cair em informações falsas.

Confira matéria no G1

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