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Brasil falha no combate às fakes news e enxuga gelo no início da campanha eleitoral

Fonte: Folha de SP

17 de agosto de 2022

Financiadores e intermediários seguem impunes; faltam cooperação e transparência às plataformas

Entre a campanha eleitoral de 2018 e a de 2022, que começou nesta terça-feira (16), o Brasil aprendeu sobre desinformação e puniu exemplarmente ao menos um de seus propagadores, mas ainda falha no combate a afirmações inverídicas que circulam livremente em redes sociais e aplicativos de mensagens.

Sem transparência, coordenação das plataformas e atuação consistente sobre o chamado ecossistema das notícias falsas, o país ainda enxuga gelo quando trata do tema, dizem especialistas.

O cenário, evidentemente, é diferente do de quatro anos atrás, quando as plataformas e as instituições não souberam reagir com celeridade ao volume de mentiras que viralizavam sem nenhum controle.

Em 2018, reportagem da Folha mostrou que empresas compravam pacotes de disparos em massa de mensagens contra o PT no WhatsApp, prática ilegal por se tratar de doação de campanha por empresas.

Uma das fake news que marcou aquele pleito foi o vídeo em que um narrador afirmava que Fernando Haddad (PT) iria distribuir mamadeiras com bico em formato de pênis caso fosse eleito.

De lá para cá, a dimensão do problema ficou clara. O TSE (Tribunal Superior Eleitoral) passou a tratar a desinformação como tema prioritário e houve avanço na interação com as plataformas, diz o advogado Fernando Neisser, membro fundador da Abradep (Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político).

Ele cita o esforço para institucionalizar parcerias com plataformas e iniciativas de checagem, o que tornou, segundo ele, muito mais rápida a retirada de conteúdos explicitamente falsos do ar.

Além disso, o advogado menciona dois importantes recados dados pelo tribunal em outubro passado.

O primeiro foi definido no julgamento das ações que pediam a cassação da chapa de Jair Bolsonaro (PL) e Hamilton Mourão (Republicanos). Embora o tribunal tenha julgado improcedentes as ações, firmou nesse caso o entendimento de que promover desinformação pode configurar abuso de poder econômico e uso indevido dos meios de comunicação social, sujeito a sanções.

O segundo sinal foi a cassação do deputado estadual Fernando Francischini devido à publicação de vídeo no dia das eleições de 2018 em que ele afirmou que as urnas eletrônicas haviam sido fraudadas.

Apesar desses avanços, Neisser aponta que o combate à chamada “economia de mercado” da desinformação ficou parado. Ou seja, chegou-se de alguma forma aos disseminadores e às plataformas, mas empresas que obtêm bancos de dados e fazem disparo em massa continuaram a atuar livremente.

“Imagina enfrentar o tráfico de drogas proibindo produção e consumo, mas não a venda. Não funciona”, diz. “Donos de empresas de disparo em massa podem responder a ações na Justiça eleitoral e ficar inelegíveis, mas não tem nada mais irrelevante para o dono de uma empresa do que ficar inelegível.”

O mercado da desinformação também é lembrado por Denise Dora, diretora da ONG Artigo 19 no Brasil.

“Investigações sobre o financiamento da origem da desinformação não progrediram, e o país não construiu mecanismos para evitar que a desinformação circule em larga escala nem implementou bons mecanismos para identificar autores”, afirma.

Se hoje o Brasil conhece mais o tema, os disseminadores da desinformação também passaram a usar técnicas de certa forma mais sofisticadas, diz a diretora: no lugar de falsificações primárias, como as relacionadas ao inexistente kit gay, entram ataques ao próprio sistema de votação.

Atores centrais nesse debate, as plataformas também se movimentaram de 2018 para cá, principalmente diante das críticas em relação à morosidade ou mesmo inação com que reagiam à desinformação.

Já na eleição seguinte, a municipal de 2020, elas firmaram acordos de cooperação com a corte eleitoral, segundo os quais, entre outros pontos, comprometem-se a facilitar a comunicação entre empresas e TSE, a cumprir as próprias políticas e a priorizar informações verídicas sobre o sistema eleitoral.

A cooperação, entretanto, está longe de barrar a disseminação de notícias falsas. As empresas não abrem dados sobre investimentos em inteligência artificial em português do Brasil nem sobre reforços de times, tampouco sobre resultados efetivos de suas políticas.

“A estratégia de divulgação de desinformação e de discurso de ódio considera a estrutura de interação entre as plataformas, mas elas não conversam. Os vídeos vão do YouTube para o WhatsApp e para o Telegram, por exemplo, mesmo que se busque apagar. Então seria absolutamente necessária uma harmonização, um compromisso conjunto de combate”, diz Paulo Rená, codiretor da ONG Aqualtune Lab.

Confira matéria na Folha de SP

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