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7 de março de 2022
Mais que uma crise de ambição, vivemos a necessidade de refletir sobre o que ambicionamos no trabalho. Pode ser transformador
“Quando 25 milhões de pessoas deixam seu emprego, há algo além do burnout.” Essa é a linha fina de um artigo publicado no New York Times duas semanas atrás e que viralizou. Do LinkedIn ao Twitter, até hoje há muita gente postando o texto da jornalista Noreen Malone de título desolador, “A era da antiambição”.
Malone dá um panorama da realidade pandêmica que intensificou algo que os dados já demonstravam mesmo antes de a Covid imperar: “Quase ninguém que conheço gosta tanto de trabalhar atualmente”, afirma ela. Seja pela fadiga de Zoom, seja por termos transformado nossas casas em escritórios, além de todo o entorno dramático que a doença causou, há muita gente insatisfeita quando o assunto é trabalho. No mundo todo.
De acordo com o artigo, o xis da questão foi o fim da ambição. Cada vez mais, enxerga-se menos sentido em trabalhar para “chegar lá”. A tendência deste (desanimador) momento é bater o ponto das 9h às 18h a fim de pagar boletos. Nada de almejar a chefia, mais zeros no holerite, prêmios ou reconhecimentos.
Para mim, no entanto, o cerne da crise é outro: a maneira como significamos o sucesso. É aquilo que se ambiciona que entrou em colapso. O que deveria ser um conceito complexo, subjetivo (o que é sucesso para você, afinal?) foi, ao longo dos anos, deturpado em certezas mesquinhas e autocentradas: fama, grana e poder – também alguns troféus para enfeitar as prateleiras, claro.
E como, em meio ao contexto frágil e burocrático no qual se encontram as instituições, não há muitas cadeiras disponíveis no topo da hierarquia nem tantas possibilidades de reconhecimento que supram nossos desejos hedônicos, o grande problema é que todo esse simplismo de “sucesso” opera em favor de uma dicotomia também simplória, bem-sucedido X fracassado, e torna nossa produtividade sempre aquém do ideal, como se o expediente ganhasse o aspecto de uma roda de hamster.
A performance sem propósito, que atende a lógica da nossa sociedade do desempenho, sedenta por “mais e melhor”, não se sustenta como eficiente – talvez sim como frustrante. Como certa vez escreveu um dos mais importantes economistas que já viveu, John Kenneth Galbraith (1908-2006): “Não se pode supor que o bem-estar seja maior em um nível mais alto de produção do que em um nível mais baixo. O nível mais alto de produção tem, meramente, um nível mais alto de criação de necessidades, as quais exigem um nível mais alto de satisfação”.
Em outras palavras, trabalhamos mais para trabalhar mais para trabalhar e trabalhar mais.
Quando a autora do texto do NYT diz que deve haver algo além do burnout que explique tanta insatisfação, pergunto-me se isso é preciso. Afinal, o estresse é endêmico. Só no Brasil, atinge cerca de 70% das pessoas. E não por acaso foi reclassificado neste ano como “doença do trabalho” pela OMS.
Quero dizer que passou da hora de ressignificarmos o sucesso. E, assim, recuperarmos nossa ambição – o desejo de atingi-lo. Se, estima-se, passaremos dois terços de vida trabalhando, que o êxito seja, então, aproveitar inclusive o trabalho. Basta de resignação melancólica. É hora de construir saídas.
Mais que um manifesto a favor da alegria no trabalho, este é um convite à reflexão: o que você pode fazer para tornar seus dias úteis mais bem-sucedidos? (Leia-se prazerosos, relevantes.) Às vezes, bastaria um papo com o chefe. Noutras, uma revisão de agenda com o time. Também pode ser que alguns só vejam saída ao se assumirem um Bartleby – o clássico personagem de Herman Melville que vive respondendo a suas responsabilidades com um procrastinante “Eu preferia não fazê-lo”.
Ainda assim, talvez exista um conserto diferente. E, se não houver, programe sua saída, busque outro lugar para investir os dias, reinvente os planos, crie seu próprio negócio, empreenda. Só não perca o que existe de mais vital no ser humano: a ambição de ser feliz.
Confira matéria no Meio e Mensagem
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